É comum, quando se discute sobre a leitura e a busca de informações na internet, nos depararmos com a ideia de que estamos diante do espaço infinito. Os hiperlinks e os verbetes fazem da pesquisa uma rede de conexões sem início e sem final; o crescimento da capacidade de armazenamento faz com que o limite para o acúmulo de dados se amplie continuamente; a pluralidade de fontes e referências faz com que não haja tema ou questão que ainda não tenha sido tocada.
Quanto à leitura, talvez seja melhor dizer que a perseguição ao infinito não se inicia com a internet, mas que esta radicalizou a questão. Em A Náusea, a novela de Sartre de 1938, o personagem Autodidata se depara com o paradoxo da biblioteca: se naquele saguão há um número exato de livros, faltaria tempo hábil para dar conta de todos. Não bastaria uma vida para que todos os títulos das estantes fossem parar na mesa de leitura. A postura diante da impossibilidade flerta com o desespero: “As leituras do Autodidata desconcertam-me sempre. De súbito, os nomes dos últimos autores cujas obras ele consultou vêm-me à memória: Lambert, Langlois, Larbalétrier, Lastex, Lavergne. É uma iluminação; acabo de perceber qual é o método do Autodidata vai-se instruindo por ordem alfabética”.
Em O prazer do texto (1973), Roland Barthes lembra que o processo de leitura, por si só, gera pontes com origem e destinos incalculáveis. As conexões por vezes se dão de forma ordenada; noutras, por instinto e acaso – mesmo antes do ponto de inflexão da tecnologia. “Lendo um texto referido por Stendhal (mas que não é dele), encontro nele Proust por um minúsculo pormenor. Alhures, mas da mesma maneira, em Flaubert, são as macieiras normandas em flor que leio a partir de Proust. Saboreio o reino das fórmulas, a inversão das origens, a desenvoltura que faz com que o texto anterior provenha do texto ulterior. (…) E é bem isso o intertexto: a impossibilidade de viver fora do texto infinito”, escreve Barthes.
- Autoria: Iuri Müller
- Mestrando da Faculdade de Letras / PUCRS
Faculdade de Letras / PUCRS