Em Os livros e os dias, o escritor argentino Alberto Manguel leva a cabo uma tarefa de duas vias: reler doze livros que, por distintos motivos, marcaram a sua formação como leitor e escritor, e escrever sobre cada um deles, em meio aos fatos da vida privada e ao que acontece no mundo. Organizado em formato de diário, no qual os temas se sobrepõem sem rigor, Os livros e os dias carrega consigo as impressões do tempo presente e as recordações da primeira leitura de cada um dos textos.
Para Manguel, que seleciona romances de autores como Bioy Casares, Machado de Assis e Cervantes, o momento prévio à leitura de um livro é como o estado de um universo em suspensão, prestes a anunciar as suas chances de existência. “Os cientistas imaginam que, antes de o universo passar a existir, ele se manteve num estado de potencialidade, com o tempo e o espaço em suspensão – “numa névoa de possibilidades”, como definiu um comentarista – até o Big Bang. Essa existência latente não deveria surpreender os leitores, pois para nós cada livro existe numa condição análogo ao sonho até que as mãos que o abrem e os olhos que o percorrem agitam as palavras e as despertam. As páginas que se seguem são minhas tentativas de registrar alguns desses momentos de despertar”.
A leitura que se posiciona entre duas épocas não se restringe, em Manguel, a Os livros e os dias: está presente em outras publicações e também em um acontecimento recente da sua vida. Entre 1964 e 1968, o jovem Alberto Manguel caminhava três vezes por semana até uma casa rua Maipú, em Buenos Aires, com o objetivo de ler em voz alta para um certo Jorge Luis Borges, cuja visão já estava muito prejudicada. Em 2016, mais de cinquenta anos depois, o escritor assumirá a direção da Biblioteca Nacional da Argentina – posto já ocupado pelo próprio Borges.
- Autoria: Iuri Müller
- Mestrando da Faculdade de Letras / PUCRS
Faculdade de Letras / PUCRS