Sim, a Feira do Livro de Porto Alegre, como qualquer evento semelhante, pode apresentar ao transeunte umas quantas imagens repetidas: os livros em destaque nas bancas são praticamente os mesmos e não devem surpreender o caminhante que, durante o ano, já frequenta as livrarias. Mas, como escreveu Walter Benjamin, para se conhecer de verdade uma praça é preciso percorrê-la em todas as suas direções. E, em tempos de Feira, a Praça da Alfândega também exibe os seus objetos inesperados.
Mais perto do chão do que as prateleiras das bancas, desprestigiados por vezes e ignorados pelos que caminham com muita pressa, os balaios podem abrigar econômicas surpresas. Custam cinco, dez ou quinze reais e uma caminhada de alguns minutos. Terra adentro é um desses casos. O texto traz a viagem a cavalo de Tau Golin, Pedro Luiz da Silveira Osório e Luiz Sérgio Metz pelo Rio Grande do Sul, em 1980: foram treze dias e 600 quilômetros de expedição, de Santa Maria a Jaguarão, para ver e compreender um cenário já impactado pelo alcance da modernidade. Está num dos balaios de saldos e sairá dali por dez reais.
Mais adiante, na área internacional da Feira, são novamente os usados ocasionam um bom negócio para o leitor. Há dois dias, poderia ser encontrado (preciso dizer que já não está mais por lá) um exemplar do Libro de poemas de Federico García Lorca, que reúne parte da obra do poeta e dramaturgo andaluz. Publicado pela clássica casa Losada, de Buenos Aires, a edição ainda estava com as folhas intactas e as margens coladas: é preciso buscar uma espátula ou uma lâmina afiada para folhear as páginas de Lorca. Editado em 1961, o livro ficou 54 anos à espera do seu primeiro leitor.
É novembro e a Alfândega está repleta de caminhos novos.
- Autoria: Iuri Müller
- Mestrando da Faculdade de Letras / PUCRS
Faculdade de Letras / PUCRS