Quem não merece o Nobel?

Sully Prudhomme, 'desconhecido' vencedor do Nobel de 1901
Sully Prudhomme, 'desconhecido' vencedor do Nobel de 1901

James Joyce, Virginia Woolf, Jorge Luís Borges, Júlio Cortázar, Graham Greene, Gertrude Stein, Leon Tolstói, Henrik Ibsen, Émile Zola, Jorge Amado, Manoel de Barros, Anton Tchekhov, Chinua Achebe, Carlos Drummond de Andrade, Murakami, Pynchon, Nabokov, etc., etc., etc., a lista de autores importantes ignorados pelo Nobel de Literatura pode ser quilométrica, quiçá infinita. Claro, essas ausências depõem bastante contra a credibilidade do prêmio. Mas, na verdade, alguns autores vencedores é que talvez sejam a prova maior de que o Nobel não é mesmo tão confiável assim.

Quatro anos específicos em quatro décadas diferentes – 1901, 1953, 1962 e 1974 – ilustram, por assim dizer, o pouco rigor que às vezes acomete a premiação, como nos lembra o site Homo Literatus. E o primeiro descalabro aconteceu logo na primeira edição do Nobel, quando o francês Sully Prudhomme desbancou ninguém menos que Leon Tolstói. Nenhuma razão oficial foi atribuída ao fato, mas um dos juízes teria citado a “tacanha hostilidade a todas as formas de civilização” do autor russo para lhe negar a medalha.

Em 1953, por sua vez, o vencedor da honraria literária foi, acredite, Winston Churchill, primeiro-ministro inglês que conduziu a Grã-Bretanha durante a segunda guerra mundial. Mesmo o político não tendo publicado mais que uma autobiografia em cinco volumes e algumas reportagens esparsas por aí, ganhou supostamente “por sua maestria na descrição histórica e biográfica, bem como pela brilhante oratória em defesa dos valores humanos”.

Em 1962, por sua vez, o vencedor do Nobel – John Steinbeck – não foi exatamente um desvario, se levarmos em consideração a importância do escritor, autor de As Vinhas da Ira, A Leste do Éden e O Inverno da Nossa Desesperança. Nem Steinbeck, no entanto, esperava a honra. Perguntado pelo New York Times se merecia a homenagem, ele foi sincero: “francamente, não”. Meio século depois, ao se abrir os arquivos da votação, descobriu-se que o autor não estava sequer entre a lista inicial de candidatos.

Mas o problema maior ocorreu realmente em 1974, quando o Nobel em Literatura foi concedido para Eyvind Johnson e Harry Martinson: além de serem largamente desconhecidos em quase toda livraria do mundo, os dois eram membros da própria Academia Sueca, responsável por definir os vencedores, o que, convenhamos, no mínimo deixa dúvidas sobre a lisura da escolha. Para piorar, naquele ano, Johnson e Martinson venceram uma disputa que incluía Graham Greene, Saul Bellow, que venceu dois anos depois, e Vladimir Nabokov, nunca reconhecido pela premiação.

Nada disso tira o mérito de Svetlana Alexijevich, vencedora, na última quinta-feira, do Nobel de Literatura em 2015. Mas talvez, entre o céu literário e a terra dos prêmios, existam bem mais mistérios do que supõe a nossa vã filosofia.

Autoria: Davi Boaventura
Doutorando da Faculdade de Letras / PUCRS
Colaboração:
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