Lição de Modesto Carone

Livro: Lição de Kafka (Modesto Carone)

Certa vez, e faz tempo, mais de década, eu e um amigo entrevistamos o Modesto Carone – “o cara” quando se fala em Kafka em português – para o trabalho final de uma disciplina na faculdade. E não é que é mais de uma década depois a entrevista resiste? Mérito das respostas do Carone.

Para assumir a responsabilidade de traduzir um escritor como Kafka, é preciso ter uma certa pretensão…
Até certo ponto, eu diria que sim. Quem tem pudor de mexer na obra alheia não pode ser tradutor. Traduzir implica mexer, e muito, no texto do outro.

Em que medida o sentido do texto – principalmente numa língua distante da original da obra – pode ser distorcido?
Não sei. A princípio, procuro reproduzir em português todos os elementos do original – lexicais, sintáticos, fonéticos, métricos etc. – que me parecem relevantes.

Quis que as obras de Kafka representassem em português o que representavam na língua alemã?
Quis dar uma ideia do que é a vida do texto de Kafka em sua língua. Porém, ao mesmo tempo, como já disse, tentei acompanhar passo a passo, palavra a palavra, o texto original. Nem sempre isso é possível.

Foi difícil encampar o empreendimento da tradução no mercado editorial brasileiro?
Quando comecei a trabalhar, no final dos anos 60, a situação era pior. Acho que a coisa ainda pode melhorar bastante, mas já foi bem pior. As editoras, o público e a crítica parecem estar dando um pouco mais de valor ao trabalho do tradutor.

O tradutor deve pesquisar o processo de criação de um autor como Kafka ao traduzi-lo?
Estudei bastante a obra de Kafka (vide seus ensaios reunidos em Lição de Kafka) e sabia razoavelmente como era seu processo de criação.

O senhor, além de tradutor, também cria suas próprias obras (venceu o Jabuti de 1997 com o romance Resumo de Ana). Qual atividade lhe dá mais prazer?
Traduzir é muito difícil. Mas, para mim, às vezes dá até mais prazer. Agora, escrever dá mais liberdade onde justamente a traduação a nega. No meu caso, escrevo principalmente por isso, pela liberdade, mas também porque comecei a ler cedo e quis um dia ter um livro impresso como aquele de Lobato.

Autoria: Luís Roberto Amabile
Doutorando da Faculdade de Letras / PUCRS
Colaboração:
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